Cerca de 244 mil estudantes de 6 a 14 anos estavam fora das escolas brasileiras no segundo trimestre deste ano, segundo levantamento divulgado hoje pelo movimento Todos Pela Educação. Houve um aumento de 171,1% em comparação com o mesmo período de 2019, quando o problema afetava cerca de 90 mil estudantes da mesma faixa etária.
"Em termos relativos, o percentual de crianças e jovens nesta faixa etária que não estavam frequentando a escola era de 0,3% em 2019 e passou para 1% em 2021, sendo a maior taxa observada nos últimos 6 anos", diz nota técnica do movimento. Os dados foram analisados a partir das informações da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, divulgada pelo IBGE.
Uma pesquisa do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), em parceria com o Cenpec Educação (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), já havia apontado que faixa etária de 6 a 10 anos sofreria grandes impactos este ano, já que dos mais de 5 milhões de alunos ficaram sem acesso à educação em 2020, 40% tinham essa idade.
Vale lembrar que a etapa escolar que incluía estudantes dessa faixa etária estava praticamente universalizada no Brasil antes da pandemia do novo coronavírus.
Desafios para a volta às aulas presenciais
Desde o fechamento das escolas, especialistas afirmam que a evasão e o abandono escolar serão os principais desafios dos municípios, estados e do governo federal no retorno das aulas presenciais.
Esses dados começam a dar a dimensão do problema que vamos ter, especialmente no ano que vem, durante o período de rematrícula. Temos um primeiro sinal de que o impacto vai ser grande, tanto de alunos fora da escola, quanto daqueles que estão com defasagem na aprendizagem."
Gabriel Corrêa, gerente de Políticas Educacionais do Todos pela Educação
Em relação aos alunos de 15 a 17 anos, cerca de 407,4 mil estão fora da escola. Em 2019, eram mais de 670 mil. Para Corrêa, os dados do ensino médio —considerada a etapa mais desafiadora— ainda não espelharam a realidade da pandemia.
"As famílias de crianças mais novas indicaram o abandono, enquanto os jovens por mais que não estivessem acompanhando as aulas, ainda se consideram das escolas. É preciso acompanhar de perto", avalia Corrêa. Ele foi responsável pela análise, que observou os microdados da Pnad Contínua e fez as comparações com anos anteriores.
Alunos negros de baixa renda são ainda mais vulneráveis
Entre os motivos para abandono ao longo da pandemia estão a necessidade de trabalhar para complementar a renda familiar e a falta de acesso à internet para acompanhar as aulas remotas. Análise feita pelo Plano CDE mostra que as famílias de alunos negros têm 63% mais risco de ter medo da evasão de seus filhos do que pais de estudantes brancos.
Quando o recorte também inclui a condição social, o cenário fica ainda pior: entre os alunos negros de famílias com renda de até dois salários mínimos, o medo de desistência chegou a 50%.
Para entender o tamanho do problema, o gerente de Políticas Educacionais do Todos sugere que as secretarias de Educação tenham registros "consolidados, informativos de todos os alunos que atendem" com o objetivo de identificar quem são os estudantes em evasão e os que correm o risco.
Corrêa afirma também que as redes devem trabalhar com os problemas que levam os alunos a abandonarem os estudos. "São problemas educacionais, de alunos que não enxergam sentido em continuar já que estão atrasados na aprendizagem, mas há problemas sociais", explica.
Uma "estratégia intersetorial" é o ideal para mitigar os efeitos da pandemia. "Educação precisa trabalhar com assistência social e a Saúde, por exemplo", sugere.
Estudo feito pelo centro de pesquisas educacionais Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional) e pelo Comitê de Educação do IRB (Instituto Rui Barbosa), em parceria com tribunais de contas, mostrou que o risco de evasão escolar atinge até um terço de alunos do 9º ano no Norte e Nordeste.
Nessas mesmas regiões, o risco de evasão pode afetar quase 25% para estudantes do ensino médio.
Quem não abandonou está com aprendizagem atrasada
O levantamento também revela um aumento no número de alunos de 6 a 14 anos que frequentam a pré-escola —a etapa se destina a crianças de 4 e 5 anos. Eram cerca de 396,8 mil em 2019 e passaram a cerca de 702,7 mil em 2021. Em termos percentuais, os números representam uma alta de 1,5% para 2,8% do total da faixa etária de 6 a 14 anos.
De acordo com o Todos, são os maiores valores absolutos e relativos da série histórica, que começou em 2012.
Em relação ao Ensino Médio, o número de jovens de 15 a 17 anos que estão em outras etapas, como ensino fundamental ou EJA (Educação de Jovens e Adultos), aumentou de 1,6 milhão no ano passado para 1,9 milhão para 2021.
"Não é só estar na escola, mas estar no ano escolar em que se é esperado. Precisamos olhar para a trajetória desses estudantes", afirma Corrêa.
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