“O Paraná está em segundo lugar no consumo de agrotóxico no Brasil, talvez na frente do Mato Grosso. A situação é realmente muito critica”, alertou a procuradora Margaret Carvalho do Ministério Público do Trabalho (MPT) durante uma conferência sobre o agronegócio. A palestra foi realizada nesta quinta-feira (23) na Agroecologia organizada pelo MST no campus Rebouças da UFPR de Curitiba.
O diagnóstico feito pela procuradora descreve uma situação muito problemática em relação ao uso dos agrotóxicos no estado. “De acordo as informações que temos, a maioria das cidades do Paraná tem problemas de contaminação da água. Encontramos resíduos de 27 agrotóxicos na água de 327 municípios em um total de 399. Podemos comprar alimentos agroecológicos mas não podemos fugir da água que tomamos”, disse a procuradora Carvalho ao Plural depois do evento, ressaltando como os municípios envolvidos teriam que exigir providências da Sanepar.
“Não é possível que os cidadãos tenham que pagar para tomar água contaminada”, comentou a procuradora do Ministério Público do Trabalho.
A contaminação da água foi determinada também pelo maior uso de agrotóxicos por parte das empresas ligadas ao agronegócio, que em particular nos últimos anos se beneficiaram da política de liberalização destes produtos por parte do governo Bolsonaro. “Tudo isso levou as plantas a se tornarem também mais resistentes, então os empresários começaram a utilizar uma quantidade maior de glifosato e de outras substâncias tóxicas. O recurso a esses produtos também tem uma relação direta com o aumento de casos de câncer e de malformação dos nascituros”, afirmou a procuradora.
De acordo ela, o consumidor também tem uma possibilidade para evitar o consumo de agrotóxicos no seu dia dia: “É melhor escolher produtos de pequenos produtores nas feiras ou comida de produção orgânica. Muita gente reclama do preço porque com certeza é mais caro comparado com outros, mas os danos à saúde vão ter impacto maior mais tarde, inclusive no lado econômico”.
Dados mais gerais sobre o problema do agrotóxico no Brasil foram trazidos pela professora da USP Larissa Mies Bombardi, que foi obrigada a sair do país por conta de suas denúncias contra o agronegócio brasileiro, que causaram várias ameaças contra sua família.
“Os países da União Europeia e a China são os principais vendedores de agrotóxicos diretos para o mercado latinoamericano. O problema é que esses países proibiram mais de 270 substâncias enquanto o resto do mundo nem alcançou as 30.” O Brasil estaria atravessando um período de colonialismo químico, de acordo com a professora Bombardi que acabou de lançar um livro (“Agrotóxicos e colonialismo químico”) para aprofundar este conceito. Segundo a autora, o grande uso dessas substâncias não levou a um aumento da produção de alimentos, mas apenas de energia ou commodities agrícolas (como milho, soja, algodão e açúcar). “Não estamos produzindo alimentos mas apenas produtos que servem para os grandes proprietários da terra”, explicou a professora.
O preço desse tipo de produção é pago pelas pessoas mais frágeis da sociedade, como os humildes e os indígenas. De acordo com a docente da USP, “até hoje foram identificadas 56 mil pessoas intoxicadas pelos agrotóxicos, mas sabemos que há uma grande subnotificação. Para cada caso descoberto há pelo menos 50 não notificados”. Tudo isso demonstra que há também uma grande diferença dentro do Brasil mesmo, onde as regiões Norte e Centro-Oeste estão mais expostas aos riscos dos agrotóxicos. Em particular, as estatísticas da professora Bombardi demonstram que no Norte as intoxicações por glisofato aumentaram em 238% e por mancozebe em 220%. As duas substâncias são cancerígenas e estão proibidas na União Europeia e em vários países da América Latina.
Sobre a questão da água contaminada a professora Bombardi também disse que se trata de um problema geral no Brasil: “O valor do glifosato dissolvido na água é 5.000 vezes superior na comparação com os países da União Europeia”. Uma circunstância considerada normal pela lei brasileira.
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