Falta de espaço até para se mover. Calor insuportável. Dificuldade para falar com todos os alunos. Os problemas de uma turma superlotada não são poucos, e segundo relatos feitos por professores da rede estadual de ensino do Paraná, têm sido frequentes em vários colégios do estado. Nas últimas semanas, a APP-Sindicato, que representa professores e funcionários do ensino público paranaense, recebeu uma enxurrada de reclamações de turmas que ultrapassam o limite legal de 40 alunos.
A irritação dos professores cresceu depois que o governo de Ratinho Jr. (PSD) pediu uma retratação a uma rede de tevê que falou em casos de superlotação. A Secretaria de Estado da Educação afirmou que respeita o número de estudantes definidos em lei e que não haveria turmas excedendo o limite de 40 alunos.
As listas de chamada que começaram a chegar à APP a partir de então, porém, mostram turmas com até 47 alunos – quase 20% acima de um limite já bastante generoso. As superlotações foram denunciadas de diferentes regiões. No núcleo de Curitiba, foram indicadas situações com salas de mais de 45 alunos em frequência.
Outros professores, embora não queiram ter seus nomes divulgados, falaram em turmas com mais de 40 alunos ativos – ou seja, estudantes que frequentam a escola todos os dias. Os relatos mostram a dificuldade que os docentes enfrentam em função disso.
Superlotação
A superlotação é o tema desta reportagem, que inaugura a série de reportagens “Só a Educação Salva”, que será publicada pelo Plural nos próximos três meses, mostrando os reais desafios da educação no Paraná. O tema é considerado um dos mais importantes no momento porque a grande quantidade de alunos em sala de aula prejudica tanto quem dá aula quanto quem tenta aprender.
A normativa válida no Paraná determina um limite de 35 alunos por turma de Ensino Fundamental. No Ensino Médio, etapa com o maior número de matrículas no sistema estadual, a contagem máxima deve ser de 40.
O limite está previsto em resolução de 2011. Em 2005, deputados estaduais tentaram criar lei específica para impedir mais de 35 estudantes por sala na rede, mas a proposta, mesmo aprovada em Plenário, foi vetada integralmente pelo então governador Roberto Requião, hoje do PT. Mesmo o limite de 40 estudantes, porém, não vem sendo respeitado.
Vida de professor
Ao Plural, uma docente que falou em condição de anonimato afirmou lecionar em uma turma de 2º ano do Novo Ensino Médio com 43 alunos ativos, ou seja, que vão todos os dias para a escola. “Em dias de calor, é insuportável ficar dentro da sala, pois somente dois ventiladores funcionam. Basicamente, eu fico espremida embaixo do Educatron [monitor para exibição de conteúdos multimídia], na frente da sala. Mal consigo me mexer, pois as carteiras dos alunos juntam na mesa do professor e estão bem próximas ao quadro”, relatou.
A restrição física não seria ainda o único entrave de salas com lotação acima do permitido. Segundo a docente, o trabalho pedagógico também é diretamente afetado, já que quanto mais estudantes por turma, mais difícil é trabalhar de maneira individual com os alunos. O excesso prejudica ainda o uso das plataformas digitais de uso obrigatório no modelo de ensino estabelecido pelo governo Ratinho Jr. As ferramentas exigem acesso a computadores, muitas vezes em quantidade diminuída nas unidades.
“Eu leciono uma disciplina que exige o uso de uma plataforma, então chega a ser desesperador quando é dia de usá-la, pois o laboratório só tem 20 computadores para 43 alunos”, diz a docente. “É humanamente impossível falar de números e índices de qualidades nessas condições de sala de aula”.
O limite já é alto
A APP-Sindicato afirma que casos de desrespeito ao limite estabelecido em lei parecem ser pontuais. Mas o problema começaria com a própria definição do número aceitável. Para a Secretária Educacional do Sindicato, Vanda Santana, em geral 35 alunos por turma de ensino médio seria um limite mais razoável. Mas ela aponta um outro fator importante: seria preciso levar as condições do colégio para ver se há condições de atender o limite máximo legal.
“É preciso tratar desse tema em conjunto com as condições gerais da escola Tem alguns elementos que são muito importantes”, afirma ela. “O tamanho da sala de aula, a condição climática do ambiente, a acústica e a idade dos estudantes precisariam entrar na conta, mas o governo prefere analisar só se cabem as carteiras na sala.”
Segundo a APP, a quantidade de No Fundamental em geral as turmas são mais cheias. “Isso tem a ver com as condições para que os alunos permaneçam na escola, para evitar a evasão”, afirma Vanda Santana.
Segundo a APP, a resolução determinando o limite de estudantes por turma traz um parâmetro, mas é preciso levar em conta esses outros aspectos. E isso, lembra Vanda Santana, tem a ver com as condições de trabalho. “Como foi diminuída a quantidade de horas-atividade, uma sala com 35 alunos fica mais pesada”, diz ela.
Governo afirma que segue resolução
Apesar do acúmulo de relatos contrários, a Secretaria de Educação reafirma que segue a regulamentação estabelecida pela resolução de 2011. Em nota, a Secretaria ressaltou que a capacidade máxima especificada na normativa não significa que todas as vagas estejam ocupadas, mas, sim, que até 40 vagas estão disponíveis.
A Secretaria não comentou as denúncias feitas pelos professores, nem falou das listas que na prática atestariam o relato dos docentes. “Em circunstâncias excepcionais, como transferências ou desistências ao longo do ano letivo, as escolas abrem espaço para alunos de outros estabelecimentos interessados. Contudo, os nomes desses alunos permanecem nas listas de chamada até o final do ano letivo”, diz a nota.